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segunda-feira, 31 de maio de 2010




Somos como colcha de retalhos,
Vestidos de estórias,
escritas a várias mãos.
Um rizoma, por vezes forte fincado no chão,
por outras fracos como âncora solta na água
Nessa costura diária,
montamos o quebra-cabeças de nós mesmos
Na falta de uma peça, ou deixamos para lá e seguimos nosso caminhos;
ou obsessivamente tratamos [tentamos] preencher a lacuna infindável
da falta inerente a ser humano. Anita Lester [contribuição de Diego-inspiração]

Insônia



Face de quem dormiu e acordou
Rosto [des] figurado
Ainda não vestida a máscara do despertar
À espera ... que Morpheus reconduza-o
para o mundo dos sonhos...
Mas, qual a diferença do sonho onírico 
daquele sonho acordado em vigília,
chamados devaneios...
Em vigília [pensa-se] ter controle...
mas que nada! 
Na verdade é idéia [de]formada pelo ego
daquilo que o sono inconsciente nos presenteia,
sem amarras, livre das censuras.
Por vezes, "presente de grego", outros...]
InS[Piração]...aguardo-te Morpheus...
por mais breves momentos que sejam!

Anita Lester

domingo, 30 de maio de 2010

Perder-se



De longe serpente
De perto, Medusa
A pele chama,
A voz reclama.
Os olhos suplicam.
O coração, que não mais há [virou pedra],
Atira-se ao precipício da dor
dos [des]amados
Assisto ao mundo de cócoras
Porque de mim não me acho
Perco-me sempre...
Anita Lester

Sombra



Quem sou eu...essa que me tornei ou aquela que vive a [en]tornar-se dentro de mim buscando as fendas na minha fáscia para encontrar o luar? Anita Lester

sábado, 29 de maio de 2010

Turbilhão




Diferente de não querer é não se ter razão sobre as coisas
Ao menos a razão convencionada pela sociedade [hipócrita] na qual [sobre]vivemos
Alma velha em um corpo novo que envelhece a cada não
Fácil falar que algo é errado, impróprio
Difícil é viver numa apercepção de si mesmo
Onde o que é importante, na verdade imprescindível,
Torna-se vil no próximo segundo
O amado é odiado tanto quanto e
na mesma medida da balança viciada
E saber-se certo em meio a tantas [in]certezas tão certas dos Outros
É talvez como uma criança se sente quando afirmam a ela que o caixote,
que até então era um carrinho, é apenas e nada mais que um caixote.
Anita Lester

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Inspiração em "Poema em linha reta" de Fernando Pessoa



Que se quebrem os telhados de vidro...
e os estilhaços? que se espalhem sobre a hipocrisia! Anita Lester
Poesia de Alberto Caeiro



Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem  alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo :  "Fui  eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.
 

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Dia nublado



Deito-me sob a luz que ainda não precisa ser acesa
Esperando a calmaria - que não chega
Pensamento à galope, corpo inerte
O que estará fazendo aquele sempre amor,
agora apartado de minhas inconstâncias?
Trabalha, come, dorme...
Será que sente falta em algum momento nostálgico do dia -
assim como eu?
Libertei-te de mim, mas só nos dias ensolarados
Não precisa ser segredo...basta ser nosso. Anita Lester

terça-feira, 25 de maio de 2010

Relicário - Nando Reis



 Entre suas pernas ela está...

É uma índia com um colar
A tarde linda que não quer se por
Dançam as ilhas sobre o mar
Sua cartilha tem o a de que cor?
O que está acontecendo?
O mundo está ao contrário e ninguém reparou
O que está acontecendo?
Eu estava em paz quando você chegou

E são dois cílios em pleno ar

Atrás do filho vem o pai e o avô
Como um gatilho sem disparar
Você invade mais um lugar onde eu não vou
O que você está fazendo?
Milhões de vasos sem nenhuma flor
O que você está fazendo?
Um relicário imenso desse amor

Corre a lua, por que longe vai?

Sobe o dia tão vertical
O horizonte anuncia com seu vitral
Que eu trocaria a eternidade por essa noite
Por que está amanhecendo?
Peço o contrário, ver o sol se por
Por que está amanhecendo?
Se não vou beijar seus lábios quando você se for?

Quem nesse mundo faz o que há durar

Pura semente dura o futuro amor
Eu sou a chuva pra você secar
Pelo zunido das suas asas você me falou
O que você está dizendo?
Milhões de frases sem nenhuma cor
O que você está dizendo?
Um relicário imenso desse amor

O que você está dizendo?

O que você está fazendo?
Por que você está fazendo assim?


"[...] nunca de um sentimento que subsista,
nunca de uma emoção que continue, 
e entre para a substância da alma.
Tudo em mim é a tendência para seguir outra coisa;
uma impaciência a alma consigo mesma [...]
um desassossego sempre crescente,
sempre igual.
Tudo me interessa e nada me prende [...]
Sou dois [...] irmão siameses que não estão pegados.
Nós nunca nos realizamos.
Somos dois abismos - um poço fitando o céu."

Fernando Pessoa [Livro do Desassossego]

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Poesia



A poesia é como um filho que ao sair de suas entranhas maternas,
já não é mais seu...
mas mesmo não sendo-lhe dono carregará indefinidamente dentro de si...
sendo metade sua de fora
A poesia...eleve-se! de outro modo,
torna certa a morte do Homem 
numa vida sombria
desperta...para  o Nada!!!

Anita Lester

Mudança



Inquietação por dentro...
Hiperatividade por fora...
Confusão da[de]mente...
abre flor, agora!
Sossega, desassossego!
Luz afora...
me aproximo do salto no abismo...
extrema ansiedade e agitação!
Dessas que só as mudanças
podem em mim causar!
O que virá? Não sei...
tenho vaga idéia, do tamanho de meus mundos...
que venha e se demore a ficar velha. 

Anita Lester

Autobiografia sem factos



Do Livro do Desassossego

"A minha autobiografia sem factos, a minha história sem vida.
São minhas confissões e, se nelas nada digo, 
é que não tenho nada a dizer
(...)
Não sabendo crer em Deus e não podendo crer numa soma de animais,
fiquei, como outros da orla das gentes, naquela distância de tudo a que comumente
se chama Decadência. A Decadência é a perda total da inconsciência; porque a
inconsciência é o fundamento da vida. O coração se pudesse pensar, morreria"
Fernando pessoa

Homossexualidade [autoria de adolescentes da escola pública]



"Estou aqui mais uma vez, pra te falar da homossexualidade 
e o que ela nos faz pensar...
Homens com homens e mulheres com mulheres...
temos que respeitar o máximo que pudermos.
Veja os jovens descobrindo o que eles realmente são e
o que têm no coração...
mas ninguém vê com essa visão...
o preconceito é grande demais...creia nisto sim,
não duvide não.
Me aceite como eu sou, te peço, por favor...
sou humano e não aceito o tal do preconceito.
Um homossexual tem os mesmos direitos que qualquer um também.
Te peço me respeite,
Seja humano e me aceite"
Autores: Girlene Souza,Alessandra França,Jakeane Costa - alunos escola pública de Jijoca de Jericoacoara - concordaram com a publicação.

domingo, 23 de maio de 2010

Caminhos



[Des] acelera coração infame
Não são os caminhos que são tortos....
Tua visão apressada e infante é que está por vezes borrada.
Aquieta tua semente 
Deixa germinar...
Anita Lester


Eu trocaria a eternidade por essa noite
Por que está amanhecendo
se não vou beijar seus lábios ..
O mundo está ao  contrário e ninguém reparou....
Por onde andei enquanto você procurava
Um relicário imenso desse amor
A vida é mesmo coisa muito frágil...
Estranho seria se eu não me apaixonasse por você....
Continuar aquela conversa que não terminamos ontem...ficou para hoje...
Nando Reis

DeSeJo


AREIA ONDE SÓ ANDAS TU
MAS TU NÃO ANDAS MAIS AQUI...
AINDA ASSIM ESSE LUGAR É...
... TEU
A AREIA COÇA, ROÇA, MACHUCA...
VOCÊ NÃO SERIA ASSIM...
MACIO FEITO VELUDO SOBRE A PELE
AHHHH...VOCÊ VOLTOU!
SINTO A TI ..."AMOR EU SINTO A SUA FALTA..."  
ME ADOREI ENTRE TUAS PERNAS! ANITA LESTER
VOLTANDO DO SHOW DO NANDO REIS

sábado, 22 de maio de 2010

A dor



A dor dignifica o Homem?
Dignificar, não sei se é a palavra certa....
Aprende-se com ela? - em grande parte das vezes...
Pois às vezes aprende-se a causar a dor a si ou a outrem
Regojiza-se com ela? Às vezes...ó sado-masôs
Suporta-se a ela? muito mais do que podemos imaginar!
Doentes crônicos, adeptos a tatuagem e piercing's
Agora, estabelecer dignidade???
Depende para quem...Anita Lester
Fica a sugestão da leitura de "Vigiar e Punir~de M. Foucault

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Mutação



Sem Hora
Com Pressa
Des Acelero
Per Sonificando
Dia Lética
Trans Mutando
Des Respeito
Em Balado
Hipo Crisia
A fora
A dentro

Anita Lester

Fertilidade


Transborda de teus [meus] seios férteis
a luta entre os opostos!
Quem ganha com isso?
Os infinitamente seios cada vez mais férteis.
Anita Lester

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Liberdade



"A camisa de força que quiseram vestir-me...
arranquei.
Prefiro a de Vênus!" Anita Lester

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Desejo

Viaja para dentro de mim;
e lambe os versos de desejo em prosa
barrados na minha garganta,
tolhendo-me a voz, permitindo apenas,
um sorriso de bom dia...Anita Lester

Algemas virtuais




As piores algemas não são as visíveis...[risíveis]
Há aquelas que aprisionam a alma...
Roubam-nos a liberdade,[de pular no abismo em queda livre e (in)consciente]
Prisioneiro e algoz de si mesmo, como fugir?
Ahhhh ... mil maneiras...vil maneiras....
Perdas para ganhos frívolos e fugazes.
Volto ao cárcere antes que amanheça.Anita Lester

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Verbos

                            




                            AMAR                      ANDAR                CALAR                   MATAR
                            FERVER                   CORRER              DIZER                     MORRER
                            PARIR                       SEGUIR               CONDUZIR            PARTIR

Ama correndo dizendo que partiu...

Calar ferve ... é como andar morto...

Matar ou parir? Seguir ou conduzir?

Anita Lester

Gira...gira...

Aos 4 anos ganhei uma irmã; aos 8 anos, um irmão...Nessa idade já havia morado em 3 casas diferentes;
Mudança agora para outra cidade  -  cultura extremamente diferente da minha...
Ao todo [até agora]
foram 15 casas [indo para a 16!];
Colégios foram 11 [sendo que nao fui expulsa de nenhum!  Embora por vezes merecesse!]
Faculdades foram 5, com apenas 1 concluída [essa valeu por todas!]
Infinitos cursos, empregos relâmpago com saída sem para quê! ou "com pra quê" [depende do ponto de vista!]
Relacionamentos duradouros [poucos] e outros encontros fugazes, não menos intensos...
Até agora 9 tattoo's e 2 piercing's.
Desejos e vontades, entusiasmos escorreram como areia entre os dedos, poucos grãos ficaram - estes me esforço por cultivar.

Anita Lester

domingo, 16 de maio de 2010

Clarisse pinta Anita Lester





"Sou o que se chama de pessoa impulsiva. Como descrever? Acho que assim: vem-me uma idéia ou sentimentoe em vez de me refletir sobre o que me veio, ajo quase que imediatamente. O resultado tem sido meio a meio: às vezes acontece que agi sob uma intuição dessas que falam, às vezes erro completamente, o que prova que não se tratava de intuição, mas de simples infantilidadde. Trata-se de saber se devo prosseguir nos meus impulsos. E até onde posso controlá-los. [...] Deverei continuar a acertar e a errar, aceitando os resultados resignadamente? Ou devo lutar e tornar-me uma pessoa mais adulta? E também tenho medo de tornar-me adulta demais. Eu perderia um dos prazeres do que é um jogo infantil do que tantas vezes é uma alegria pura.Vou pensar no asssunto. E certamente o resultado virá sob a forma de um impulso. Não sou madura bastante ainda. Ou nunca serei."  Clarice Lispector

Leal, o avesso do fiel?!


 (8h40min) Um cachorro late do lado de fora da janela do meu quarto;
ele sabe o que tem de fazer na maior parte do tempo, está resgistrado nos seus instintos...
O gato, por sua vez contraria o desejo dos homens, colocando-os ao seu bel-prazer,
mas não foge de sua cadeia instintiva também...
Sinto um pouco de inveja destes seres...saber o que fazer sem ter que refletir, pensar a todo tempo...no meu
caso, penso que às vezes me assemelho a esses bichinhos, intensos, impulsivos, leal [o cachorro] que é o avesso do fiel...ahhh o gato! Anita Lester

sábado, 15 de maio de 2010

Espirais

Em pleno movimento, meu corpo é um instrumento! [interpretação de Ney Mato Grosso]

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Com Pressa

De...Amar sem limites, Beber a vida, Correr do medo, Dormir mais ,Estontear a preguiça, Fumar a desordem, Gargalhar do ridículo,Holisticamente pensar, Ir para não sei onde, Jogar tudo para o alto [e correr para não cair na minha cabeça, ó gravidade!], Levar lembranças preciosas, Morrer as dores, Negar o belo [estético atual], Outras coisas [que não me lembro agora], Pular as muralhas que me prendem, Questionar os não's [e os sim's também], Rasgar preconceitos, Saudar os imperfeitos, [in] Terminar toda a coisa, Usar o que não que cabe [e rir disso], Velar os bons momentos que se foram, Xingar bem alto sem que ninguém ouça, Zoar dessa pressa toda e...viver...sem pressa...Anita Lester

quinta-feira, 13 de maio de 2010

[Deses] Espera...



Espera
"A espera dói como facas [re]talhando cada fáscia de minha pele
Por que não sou como muitos, que simplesmente sentam em suas
poltronas confortáveis em frente a um espasmódico programa televisivo
enquanto a vida passa por suas janelas?
Não...eu quero mais! Muito mais que nem sei o quanto ou o quê exatamente...
Apenas quero...quero o anúncio da euforia, do desejo, da incerteza, da própria
impaciência, roda montanha-russa." Anita Lester

Insone

A noite me acorda com cheiro inebriante de um dia que nunca chega...
Alguns cigarros, café e
letras que dançam pela minha [de] mente [re]criação de mim sem mim mesma
agora 7 horas no relógio...o inevitável chegar do dia...que seja o que vier...
[Anita Lester]
Sobre mim cavalgas
Cingindo-me os flancos
Colhes à passagem
a luz do instante
De dentes cerrados
ondulas, avanças
retesas os braços
comprime as ancas
Depois para frente
Inclinas-te olhando
o que entre dois ventres
ocorre entretanto
e o próprio galope
em que vais lançada
Que lua te empolga
Que sol te embriaga
Lua e sol tu és
enquanto cavalgas
Amazonae égua
de espora cravada 
no centro do corpo
Centauresa alada
com os seios soltos
omo feito de água
Queria bebê-los quanto mais te dobras
Os cabelos esses
Sorvê-los agora
Mas de cada vez
Que o rosto aproximas
já é outra a sede
que me queima a língua
A de nos teus olhos
Tão perto dos meus
Descobrir o modo de beber o céu
[Davi Mourão Ferreira]

Tempo



TEMPO

O tempo...tão relativo quando a intensidade do momento fala por si só. Saudades suas...beijos meus. [Anita Lester]

quarta-feira, 12 de maio de 2010



Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além...
Mais este e aquele, o outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disse que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar
[Florbela Espanca]

Vôo noturno



"Quero viver sem hora...sem dia...[sobre] voar o tempo" Anita Lester

Espelho [ohlepsE]



"Eu sou aquela que por trás o espelho 
Gargalha do medo
e da dor
refletida entre a palidez e o colorido
do mesmo reflexo" Anita Lester

Lya... sempre...Luft



"Quem é essa agora?
Que me assusta e me atrai
Sorrateira ela, sou eu
Ou é alguma sombra
Que me segue como um bicho?
Rastejando nos calcanhares de minh'alma?
Lá está, Lá está
Sabe tudo, faz tudo
Eu...sou apenas ferramenta
Garganta pela qual ela chama,
chama...chama" Lya Luft

Ser Pulsional



"Ser humano não é ser racional [essa foi a estupidez a que Descartes nos lançou]
 Ser humano é ser pulsional, estranho de si mesmo. Entranhas daquela que repele minhas vísceras
 ainda que sem a qual nada sou.
 Forma abstrata da dor e do que sou [não há medicamento para isso], do divino, desejo capaz de se 
 [trans]formar num grito de libertação daquilo que enseja um molde bizarro de meus sonhos e devaneios" Anita Lester

TABACARIA - FERNANDO PESSOA / ÁLVARO CAMPOS




Este incrível poeta, traduziu Anita Lester em cada palavra...bebê-lo-ei

      TABACARIA
       Não sou nada.
      Nunca serei nada.
      Não posso querer ser nada.
      À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
      Janelas do meu quarto, Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é (E se soubessem quem é, o que saberiam?), Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente, Para uma rua inacessível a todos os pensamentos, Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa, Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres, Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens, Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
      Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
      Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
      E não tivesse mais irmandade com as coisas
      Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada De dentro da minha cabeça,
      E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
      Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu. Estou hoje dividido entre a lealdade que devo À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
      E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
      Falhei em tudo.
      Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
      A aprendizagem que me deram,
      Desci dela pela janela das traseiras da casa.
      Fui até ao campo com grandes propósitos.
      Mas lá encontrei só ervas e árvores,
      E quando havia gente era igual à outra. Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?
      Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
      Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
      E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
      Gênio? Neste momento
      Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
      E a história não marcará, quem sabe?, nem um, Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras. Não, não creio em mim.
      Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
      Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
      Não, nem em mim...
      Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
      Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
      Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
      Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
      E quem sabe se realizáveis,
      Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente? O mundo é para quem nasce para o conquistar E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão. Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez. Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo, Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu. Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda, Ainda que não more nela; Serei sempre o que não nasceu para isso;
      Serei sempre só o que tinha qualidades;
      Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta, E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira, E ouviu a voz de Deus num poço tapado. Crer em mim? Não, nem em nada.
      Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
      O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
      E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
      Escravos cardíacos das estrelas,
      Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
      Mas acordamos e ele é opaco,
      Levantamo-nos e ele é alheio,
      Saímos de casa e ele é a terra inteira,
      Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
      (Come chocolates, pequena; Come chocolates! Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates. Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria. Come, pequena suja, come!
      Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
      Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
      Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
      Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
      A caligrafia rápida destes versos,
      Pórtico partido para o Impossível.
      Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas, Nobre ao menos no gesto largo com que atiro A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas, E fico em casa sem camisa.
      (Tu que consolas, que não existes e por isso consolas, Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva, Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta, Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida, Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua, Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais, Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê - Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
      Meu coração é um balde despejado.
      Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
      A mim mesmo e não encontro nada. Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta. Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam, Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam, Vejo os cães que também existem, E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo, E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
      Vivi, estudei, amei e até cri,
      E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
      Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
      E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
      (Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
      Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
      E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
      Fiz de mim o que não soube
      E o que podia fazer de mim não o fiz.
      O dominó que vesti era errado.
      Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
      Quando quis tirar a máscara,
      Estava pegada à cara.
      Quando a tirei e me vi ao espelho,
      Já tinha envelhecido.
      Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
      Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
      Como um cão tolerado pela gerência
      Por ser inofensivo
      E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
      Essência musical dos meus versos inúteis,
      Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
      E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
      Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
      Como um tapete em que um bêbado tropeça
      Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
      Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta. Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada E com o desconforto da alma mal-entendendo. Ele morrerá e eu morrerei.
      Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos. A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também. Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta, E a língua em que foram escritos os versos. Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
      Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
      Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
      Sempre uma coisa defronte da outra,
      Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
      Sempre o impossível tão estúpido como o real,
      Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
      Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
      Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?) E a realidade plausível cai de repente em cima de mim. Semiergo-me enérgico, convencido, humano, E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
      Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
      E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
      Sigo o fumo como uma rota própria,
      E gozo, num momento sensitivo e competente,
      A libertação de todas as especulações
      E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
      Depois deito-me para trás na cadeira
      E continuo fumando.
      Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
      (Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
      Talvez fosse feliz.)
      Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
      O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
      Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
      (O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
      Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
      Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
      Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
      Álvaro de Campos, 15-1-1928
       

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    Se buscas a "verdade", é o que menos encontrarás, desde que penso que isso não existe. Aqui está a minha verdade...a verdade de Anita Lester, que nem mesmo sei o quanto é real. Aqui está a MINHA verdade, a MINHA mentira, MEUS devaneios, MEUS desejos e sonhos [e pesadelos?]. Mesmo não sendo eu, talvez haja algo de você também...assim...seja bem vindo[a] ao mundo de Anita Lester.